30 maio Quero ser Músico Entrevista: Conrado Paulino
O projeto Quero ser músico, do BLOG SL, segue entrevistando profissionais da área com intuito de contribuir com uma geração de futuros músicos. As postagens da série trazem as áreas de atuação, pontos fundamentais da atuação do musicista.
Atuação Diversificada
Esse é o motivo central da nossa entrevista. Pontos que giram em torno do que desenvolve diretamente a carreira de Conrado Paulino, violonista Uruguaio de nascimento, mas brasileiro de coração e música.
Entrevista
1) Em que ano iniciou sua atuação como músico profissional?
(CP) O primeiro trabalho pelo qual recebi um cachê foi o baile de réveillon de 1980, na cidade de Águas de Lindoia. Se não me engano o ano era 1980. Eu era super iniciante, estava a começar num conjunto de Campinas (SP), cidade onde morava, e surgiu de último momento esse trabalho.
Na realidade, naquela época tinha tanto trabalho para os músicos que quando chegava réveillon, ano novo e carnaval faltavam profissionais. Um empresário da região precisava muito de um conjunto para tocar num hotel de Águas de Lindoia e não conseguia nenhum. Alguém indicou o conjunto em que eu tinha acabado de entrar – e que era realmente fraco – e lá fomos nós, com pouca experiencia e muita cara de pau.
2) Quais áreas atua diretamente como músico profissional?
(CP) Além de ter minha própria carreira como artista, eu acompanho outros artistas, principalmente cantoras; também toco como instrumentista (melhor chamar de “operário” da música) em eventos, tocando jazz e mpb instrumental e atuo eventualmente como arranjador. Além disso, tenho uma forte atuação como professor, desde aulas particulares até cursos nos grandes festivais de oficinas de música – como os de Curitiba, Brasilia, Porto Alegre ou Ceará – incluindo cursos de extensão em universidades do Brasil, Uruguay e Argentina.
3) Como atuar na educação musical contribui para suas atividades artísticas?
(CP) De forma indireta, porém importante. Como músico, o estudo de pedagogia permitiu entender-me melhor enquanto artista e permitiu-me também ter mais consciência da minha própria música.
Isso significa compreender como ela deve ser estilística e conceitualmente, como deve soar e se apresentar aos outros e, principalmente, qual é meu lugar e meu objetivo como artista.
Como professor, a prática pedagógica me permitiu também entender e definir minha missão como educador, assimilando o contexto histórico e cultural em que estou inserido como professor e me orientando na forma de agir nesse contexto.
E, como profissional da música, a área de educação musical me trouxe muitas oportunidades de trabalho, seja dando aulas em escolas importantes como participando de oficinas, cursos e workshops no Brasil e no exterior, além de escrever livros.
4) A experiência como instrumentista acompanhante auxilia no desenvolvimento de sua produção artística individual?
(CP) Não sei se poderia generalizar, mas posso afirmar que no meu caso auxiliou sim. Me deu acesso a um vasto e variado repertório, me ensinou o valor da dinâmica em cada música e no espetáculo como um todo, me possibilitou ver in loco como atuam os artistas, desde a questão do repertório, a concepção do show, a comunicação com o público e até questões comerciais ou de vestimenta, etc etc.
5) Quais obras definem seu fazer artístico para um ouvinte que pretende conhecer seu trabalho? Tanto na discografia como músico solista, quanto acompanhante…
(CP) Me parece difícil escolher, é como eleger entre dois filhos…
Como solista, se eu tivesse que recomendar apenas uma música talvez escolhesse “Menina da lua”, que tem no YouTube. Como acompanhante, o vídeo com Rosa Passos cantando “Eu sei que vou te amar” é bacana e, para mostrar o trabalho do meu Quarteto, provavelmente recomendaria a versão de 2017 da minha composição “Nena”, que tem no YouTube também
6) Falando sobre a questão dos livros: Quais materiais possui publicado no mercado editorial brasileiro com viés educativo?
(CP) Tenho 8 livros, sendo três volumes da série “Fundamentos da Improvisação”, um livro sobre formação de acordes chamado “Construção, distribuição e cifrado de acordes: Regras de Harmonia Vertical” e um álbum de arranjos para violão, “Violão Brasileiro Contemporâneo: Arranjos de Conrado Paulino”.
Esses métodos estão disponíveis no mercado, e tenho ainda os três volumes da série “Método de Violão e Guitarra” que no momento estão fora de estoque, aguardando uma reformulação para efetuar o relançamento.
7) Qual a importância do CLAM, escola do Zimbo Trio, para sua carreira como educador?
(CP) Foi enorme. Primeiro porque foi a oportunidade laboral que me permitiu ter alguma segurança financeira para sair de Campinas e me estabelecer em São Paulo, na segunda metade da década de 1980.
Mas principalmente porque era uma escola muito organizada e rígida na questão pedagógica. Já na década de 1980 o CLAM tinha cursos de treinamento interno, cursos de reciclagem e conceitos de “qualidade total”, satisfação do cliente e excelência profissional, conceitos estes que só chegariam nas grandes empresas anos mais tarde (e acredito que nunca chegaram a algumas outras escolas).
Ninguém dava aula no Clam sem ter sido aluno e sem ter passado por um treinamento antes, incluindo uma fase de “monitor”, que era um tipo de estágio.
Os professores recebiam material sobre pedagogia durante o ano todo como leitura opcional e tinham também cursos de reciclagem duas vezes por ano.
O mais interessante é que durante esses cursos não se falava de música e sim de pedagogia, o que é muito lógico já que a escola precisava em primeiro lugar de bons professores e não necessariamente bons músicos.
Nos cursos falava-se de filosofia da educação, de pedagogia e suas diferentes tendencias e escolas, de técnicas didáticas, formulação de objetivos, mecanismos de avaliação dos alunos e dos professores, planejamento de aula e muitos outros assuntos relativos à formação do professor.
8) Como o CLAM contribuiu com uma geração de músicos brasileiros na década de 1970 e 1980? O que havia no perfil educacional do CLAM que o diferenciava de outras iniciativas educacionais presentes no Brasil naquele momento?
(CP) O que havia na escola a nível pedagógico é o que relatei anteriormente. Mas também foi a primeira escola do Brasil a ensinar musica popular de forma séria, ensinando por música e incluindo o estudo de harmonia e improvisação, um verdadeiro mistério na época.
Dessa forma, a escola mirava alunos mais adiantados, ou seja, tinha um discreto viés profissionalizante. Além disso estava focada na música brasileira e no jazz (as duas preferencias mais frequentes e importantes do músico popular que quer aprender a sério) e ainda tinha a “grife” do Zimbo Trio, um fator que lhe dava muito prestigio e a garantia de que o ensino seria e qualidade.
Esse ambiente atraiu a todos os jovens que tinham intenção profissional, formando músicos que hoje são referências como Léa Freire, Teco Cardoso, Debora Gurgel, Percio Sapia, Lelo Izar, Vinicius Dorin, Vitor Alcantara, Tomati, Alexandre Pivatto, Giba Estebez, Daniel Maudonnet, Benoit Decharneaux, Breno Chaves, Giana Viscardi, Mariana Aydar, Zé Godoy, Duda Neves, Gê Cortes, Renata Montanari, André Christovam, Chico César, Vitor Biglione, Nico Assumpção, Serginho Carvalho, Michel Freidenson e muitos outros.
9) O que sugere para alavancar o processo de atuação profissional de um futuro musicista?
(CP) Além das recomendações tradicionais – estudar muito e ouvir mais ainda – eu diria que o novo músico tem que dedicar um tempo para “network”, ou seja, fazer e cultivar relações públicas, estabelecendo contatos profissionais e aprendendo a lidar com a parte de promoção e marketing do próprio trabalho.
Isso às vezes significa saber lidar com editais de incentivo, marketing cultural, produção de eventos, domínio de softwares de edição de áudio, de vídeo e de imagens, etc etc etc. Ou seja, o músico novo tem que ter controle de toda sua obra, desde a ponta inicial ate a venta de shows e CDs
10) Quais projetos futuros possui em sua atuação como músico profissional?
(CP) Em breve vai sair meu novo CD chamado “A Canção Brasileira”, desta vez de violão solo (o anterior foi com o meu Quarteto); vou ministrar um workshop na UEL de Londrina; vou ministrar os cursos de violão e de harmonia e dar um concerto na primeira semana de julho no Festival “Música na Ibiapaba” (Ceará); vou ministrar os mesmos cursos no Festival de Música de Itajaí (Santa Catarina) do dia 01 a 08 de setembro; nos meses de setembro e novembro vou dar um curso na Escuela Universitária de Música da Universidad de la República, em Montevideo (Uruguay) e em outubro vou participar do Festival Guitarras del Mundo em Argentina, realizando quatro concertos em quatro cidades diferentes.
Também pretendo ainda este ano gravar um novo CD, desta vez focando somente o acompanhamento, no formato violão e voz, com várias cantoras e cantores.
Caríssimo amigo Conrado Paulino, agradeço a entrevista.
A contribuição com uma nova geração de músicos profissionais, melhor formada, mais informada, é um legado que com certeza temos em comum.
(CP) Eu sou quem agradece, fiquei muito feliz pelo convite! Meus parabéns pelo trabalho sério e de qualidade que você e o Souza Lima realizam, uma grande contribuição para a cultura no geral e a música em especial.
Entrevista realizada por e-mail em 29 de maio de 2018, por João Marcondes.
Essa publicação foi atualizada em 30 de maio de 2022. Vamos em frente!