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Quero ser Musicista Entrevista: Tatiana Parra

Quero ser Musicista Entrevista: Tatiana Parra

PRELÚDIO

O BLOG Souza Lima segue em seu projeto de entrevistas. Hoje a entrevistada é Tatiana Parra, um exemplo de sua geração quanto a criação, obra e carreira.

Seguimos trabalhando alheios ao movimento contrário que o Brasil parece seguir para contribuir com a formação de musicistas, conscientes de sua posição no mundo, e preparados para enfrentar as dificuldades da profissão.

ENTREVISTA #6

Nome: Tatiana de Souza Parra

Cidade Natal: Santo André, SP

Ano de Nascimento: 1980

Instrumento: Canto

Formação Acadêmica: Graduação na Faculdade Santa Marcelina; Pós-graduação: primeira turma da Formação Integrada em Voz (FIV) (Centro de Estudos da Voz – CEV -São Paulo).

Formação Livre: Somatic Voicework – The LoVetri Method™ (níveis I e II).  Workshop de improvisação vocal – Booby McFerrin.

1) Como foi seu envolvimento inicial com a música? E quando decidiu intensificar a atuação e de fato profissionalizar-se?

Minha mãe trabalhou como vocalista por 4 décadas, meu avô materno tocava violão tenor em regionais na década de 30/40, minha avó materna cantava lindamente, meus tios também são muito musicais. Minhas primeiras lembranças de vida são ligadas à música de alguma maneira – ouvindo, cantando, aprendendo melodias.

A decisão veio cedo também, mas houve um período de questionamento: no fim do colegial decidi ir atrás de uma “carreira séria” (?!) e prestei Psicologia, cursei 4 anos, mas depois migrei para o Bacharelado em Canto. Acredito que os convites e projetos profissionais que surgiram durante a faculdade foram muito significativos para minha carreira. Gravei e fiz shows com o professor Zeli Silva, que me indicou para o guitarrista e compositor Chico Pinheiro, com quem trabalhei por 7 anos, e daí não parei mais.

2) Quais as principais barreiras encontradas para o desenvolvimento da sua carreira?

Não vejo minha carreira de uma maneira isolada, mas dentro de um contexto maior. Ser mulher e artista nunca foi algo suave e certamente não é agora neste obscuro início de século em um país cujo novo governo vem travando uma guerra declarada contra a arte, o conhecimento e a educação.

A precarização do trabalho atinge os profissionais das artes de uma maneira  assombrosa, com consequências físicas, emocionais, financeiras e logísticas quase impeditivas para que a produção continue.

A velha conhecida – e tão bem descrita por Elis Regina em uma de suas antológicas entrevistas – falta de organização política da classe musical piora bastante o cenário. Apesar de tudo, sigo acreditando no poder transformador da música, na nossa união (entre os que fazem, apreciam, propagam arte e cultura) e no trabalho diário como forma de resistência.

3) Em sua obra fonográfica destaca-se a canção, quais suas principais referências no estilo entre compor e interpretar?

“Cantautores” que amo: Léa Freire (que canta com a flauta:>), Jobim, Dorival Caymmi, Joni Mitchell, Chico Buarque, Joyce, Gilberto Gil, Rita Lee, Edu Lobo, Caetano Veloso, Joan Jett, Guinga, Carlos Aguirre, Iessi, Juan Quintero, Laura Nyro, Patti Smith, Nina Simone, Kate Bush, Maria Beraldo, Bjork, Hanne Huckelberg, Meredith Monk, Tori Amos, Tarita de Souza, Andrea Dos Guimarães, Speranza Spalding, Annie Clark, Aurora…

4) Como constituiu o álbum Inteira quanto a repertório? E a faculdade de música contribui com essa tão necessária vivência da expressão de um artista? 

Lancei esse álbum quando fiz 30 anos pra celebrar minhas parcerias musicais e de vida até então e também pra entender o que era esse lugar da cantora solo, já que desde os 15 trabalhava como backing vocal e cantora de estúdio (gravações de trilhas, participações em discos de outros artistas e outros trabalhos…). Cada compositor e intérprete deste disco teve um papel crucial no meu desenvolvimento. Durante a faculdade estudava os discos do Ivan Lins e do Mehmari, com quem acabei fazendo uma turnê em 2008; também aprofundei a paixão pelo Milton e Jobim nas aulas de análise do Sérgio Molina. Escutei – e estudei – muito a Déborah Gurgel, Léa Freire, Proveta, Teco Cardoso, Cesar Camargo Mariano, todos grandes mestres… Sou muito feliz por ter reunido tanta gente maravilhosa nesse projeto, – Barbatuques, Aca Seca Trio – e por ter gravado duas parcerias minhas com mulheres que admiro demais: Dani Gurgel e Giana Viscardi.

5) Como foi a produção assinada em produção de Marcelo Mariano, com co-produção própria? A faculdade traz essa experiência?

A bagagem teórica e prática que adquiri nos anos de faculdade (aulas de prática de conjunto, harmonia, percepção, arranjo, improvisação, foram todas muito importantes!) se somou à minha experiência de vida com a música no momento de produzir esse disco. Poder contar com o talento absurdo e a generosidade do Marcelo Mariano foi uma alegria imensa, aprendi muito com ele durante esse processo.

6) Como é o mercado musical em sua visão perante a sociedade? Os mesmos problemas que temos na sociedade brasileira se refletem no mercado musical?

Não considero a música, assim como todas as artes, cultura, educação, etc… uma mercadoria. Acredito que os que trabalham nessas áreas ajudam a consolidar o patrimônio imaterial da humanidade e que portanto não deveriam estar sujeitos às mesmas leis do mercado. França, Alemanha e tantos outros países parecem entender bem que essa conta não fecha e vem investindo cada vez mais nessa direção. Uma pena estarmos tão longe disso. Os poucos incentivos aos quais o artista poderia recorrer para financiar seus projetos vêm sendo cortados um a um. Daí sobram duas estratégias: recorrer à iniciativa privada, que sempre prioriza contribuir com artistas já estabelecidos ou consagrados; ou ser um herói e fazer seu som e formar seu próprio público – instagram, facebook, youtube, etc. Isso tem sido alvo de muita discussão e para ser justa é uma questão mundial, não apenas brasileira. O lado bom é constatar que estamos bem servidos de heróis e heroínas!

Perfeito!

7) Como é atuar como cantora, educadora, tudo de forma concomitante, e qual a importância de diversificar a atuação na carreira de uma musicista?

Há 11 anos comecei a dar aulas e workshops de canto, inicialmente como uma alternativa para sustentar a vida e em pouco tempo virou uma grande paixão. Não diferencio sala de aula, palco ou estúdio. Os três me instigam, me estimulam, neles aprendo demais e me entrego sem medida. Essa atuação diversificada – cantar, pesquisar, ensinar, etc – exige muita disciplina, mas é totalmente recompensadora.

8) Como avalia a formação que a musicista brasileira possui hoje em música popular perante um mercado tão competitivo?

Acredito que quanto mais profundamente pesquisarmos e valorizarmos as  manifestações culturais do nosso país, mais nos beneficiaremos. Nossa riqueza e diversidade cultural é nosso maior lastro e potência pra seguirmos inspirando o mundo.

Muito obrigado Tati, agradeço muitíssimo toda atenção despendida para a entrevista. Um prazer contar contigo neste projeto. Para conferir mais sobre o trabalho da Tatiana acesse o streaming ou seu site pessoal.

Um abraço

João Marcondes

A foto que ilustra a publicação é de Maria Fanchin.

#VemProSouzaLima